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Revista M&T - Ed.71 - Jun/Jul 2002
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ENTREVISTA

Pavimentação “é questão de tecnologia, não de culinária”

Doutora em Engenharia de Transporte e Mestre em Engenharia de Solos, Liedi Legi Bariani Bernucci, coordenadora do Laboratório de Tecnologia de Pavimentação da Poli (USP), faia nesta entrevista a M&T, das pesquisas e tecnologias desenvolvidas em conjunto com a indústria de fornecedores e construtoras.

A partir de convênios com a Petrobras – Petróleo Brasileiro, Ipiranga Asfaltos, do grupo Ipiranga e universidades como a Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e o ITA—Instituto de Tecnologia da Aeronáutica, de São José dos Campos (SP), a professora tem desenvolvido diversas pesquisas de misturas asfálticas que, entre outros resultados, apresentaram novas soluções de revestimentos para vias de tráfego pesado e para execução e manutenção de vicinais, com alta performance e custos menores. Ao falar da falta de conscientização do setor, em termos de cultura de manutenção e conhecimento das diversas técnicas disponíveis, Liedi defende o fim da "velha solução feijão-com-arroz". "Pavimentação é uma questão de tecnologia, não de culinária", arremata.

M&T: Há realmente uma tendência de que o uso do concreto para vias de tráfego intenso se sobreponha ao do asfalto?
Liedi: A experiência mundial, nos países desenvolvidos, mostra que não há tendências de substituição dos revestimentos asfálticos pelo concreto de cimento para tráfego pesado e sim que coexistem as duas soluções. Os revestimentos asfálticos se prestam às rodovias de baixo volume de tráfego, às de tráfego médio e às de tráfego pesado também. Dependendo da solução e conjugação de produtos asfálticos alguns modificados por polímeros ou outros componentes pode- se perfeitamente atingir tempos de vida de projeto de 20 anos ou mais para rodovias de tráfego pesado. Há uma nova tend


Doutora em Engenharia de Transporte e Mestre em Engenharia de Solos, Liedi Legi Bariani Bernucci, coordenadora do Laboratório de Tecnologia de Pavimentação da Poli (USP), faia nesta entrevista a M&T, das pesquisas e tecnologias desenvolvidas em conjunto com a indústria de fornecedores e construtoras.

A partir de convênios com a Petrobras – Petróleo Brasileiro, Ipiranga Asfaltos, do grupo Ipiranga e universidades como a Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e o ITA—Instituto de Tecnologia da Aeronáutica, de São José dos Campos (SP), a professora tem desenvolvido diversas pesquisas de misturas asfálticas que, entre outros resultados, apresentaram novas soluções de revestimentos para vias de tráfego pesado e para execução e manutenção de vicinais, com alta performance e custos menores. Ao falar da falta de conscientização do setor, em termos de cultura de manutenção e conhecimento das diversas técnicas disponíveis, Liedi defende o fim da "velha solução feijão-com-arroz". "Pavimentação é uma questão de tecnologia, não de culinária", arremata.

M&T: Há realmente uma tendência de que o uso do concreto para vias de tráfego intenso se sobreponha ao do asfalto?
Liedi: A experiência mundial, nos países desenvolvidos, mostra que não há tendências de substituição dos revestimentos asfálticos pelo concreto de cimento para tráfego pesado e sim que coexistem as duas soluções. Os revestimentos asfálticos se prestam às rodovias de baixo volume de tráfego, às de tráfego médio e às de tráfego pesado também. Dependendo da solução e conjugação de produtos asfálticos alguns modificados por polímeros ou outros componentes pode- se perfeitamente atingir tempos de vida de projeto de 20 anos ou mais para rodovias de tráfego pesado. Há uma nova tendência americana de pavimentos asfálticos perpétuos, por exemplo, corri vida de 50 anos e manutenção a cada 20 anos, sendo esta última apenas da camada de rolamento, que serve para o caráter funcional, ou seja, de conforto e segurança do usuário.

M&T: No Brasil essa tendência já se reproduz?
Liedi: Sim. Por nossas pesquisas, cremos que estamos na direção certa para desenvolver revestimentos asfálticos de alta resistência e durabilidade. A tendência, no mercado nacional, é de aumento das soluções, disponibilizando vários tipos de asfaltos modificados, além dos já existentes.

M&T: Quais os trabalhos do Laboratório da Poli nesse sentido?
Liedi: Temos desenvolvido vários projetos de pesquisa, alguns financiados pela Finep (Financiadora de Estudos e Projetos, a principal agência do Governo Federal para o financiamento ao desenvolvimento da Ciência e Tecnologia no País) e em conjunto com a Petrobras, com financiamento pelos fundos setoriais do CTPetro (Plano Nacional de Ciência e Tecnologia de Petróleo e Gás Natural) da ANP - Agência Nacional do Petróleo. No momento, há duas pesquisas dessas em andamento, pelo período de dois anos, envolvendo a Poli, o Coppe- Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia, da UFRJ, a UFRGS e o Cenpes -Centro de Pesquisas da Petrobras, para o desenvolvimento de novas soluções asfálticas. Outro é o Pronex (Programa de Apoio a Núcleos de Excelência) financiado pelo CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico -, que une a Poli, a UFRGS e o ITA, no estudo do comportamento de revestimentos asfálticos convencionais e com asfaltos modificados por polímeros. Essa pesquisa desenvolve-se em laboratório e em campo pelo período de quatro anos. Além desses três, temos um projeto novo de pesquisa através de um convênio entre a Poli, a empreiteira Serveng-Civilsan e a Ipiranga Asfaltos, que se constitui em vários experimentos diferentes, com soluções de revestimentos asfálticos para vias de tráfego pesado. Esse convênio, com prazo de 5 anos, já concluiu a primeira de suas três etapas, denominada Corredor Tecnológico, em que cinco tipos diferentes de revestimentos asfálticos foram implantados em uma via sujeita ao tráfego severo de caminhões carregados. Paralelamente, também temos pesquisado para empresas do setor de asfalto - como Petrobras, Ipiranga Asfaltos e Greca -, para concessionárias rodoviárias e para empreiteiras, alguns novos produtos e novas soluções asfálticas. Esse trabalho tem como foco tanto as vicinais quanto as de altíssimo volume de tráfego. Além disso, temos incorporado as novas tecnologias nas aulas de graduação e nas de pós-graduação para disseminação de conhecimentos e revertido nossas pesquisas em artigos técnicos publicados nos mais distintos veículos e em teses de mestrado e doutorado.

M&T: A estrutura para esses projetos é a do próprio Laboratório?

Liedi: Sim. Adquirimos, há cerca de 7 anos, equipamentos modernos para estudo do comportamento mecânico de revestimentos asfálticos. Alguns destes equipamentos são únicos no Brasil. Temos nos concentrado em poder ampliar o potencial do laboratório, inclusive buscando financiamentos para a aquisição de novos equipamentos.

M&T: Fala-se na utilização de pneus velhos como componente da mistura asfáltica. Essa alternativa é viável em termos de qualidade e custos?
Liedi: É viável. No Laboratório, para estudara introdução da borracha de pneu moída em misturas asfálticas, fizemos três experiências diferentes com asfalto-borracha, em que a modificação do asfalto pela borracha foi realizada pelo próprio fabricante do asfalto. Recentemente, também apoiamos através da complementação de alguns testes laboratoriais, uma interessante pesquisa da Escola de Engenharia de São Carlos, da USP, sobre a introdução de borracha de pneu moído diretamente na mistura agregados-asfalto. Os resultados foram igualmente promissores. De minha parte, não tenho dúvidas que a pavimentação é uma das mais ricas formas de aproveitamento de materiais reciclados, pois consome um volume apreciável desses produtos.

M&T: Qual sua avaliação das soluções atualmente disponíveis para pavimentação?
Liedi: As aplicações dessas soluções são diferentes. Algumas podem ser utilizadas em rodovias de tráfego pesado para restaurações, mas, em sua maioria, são soluções delgadas, para aplicação sobre pavimentos já construídos e necessitando de reabilitação. Os tratamentos superficiais, por exemplo, são adequados tanto para baixo volume de tráfego (como camada de rolamento), quanto para alto volume de tráfego (como camada de proteção, de restauração e de segurança ao usuário), empregado com emulsões modificadas por polímeros.

M&T: E no caso dos micros revestimentos?
Liedi: O microconcreto asfáltico a frio é uma excelente alternativa em várias aplicações de restauração, tendo sido muito utilizado pelas concessionárias para a reabilitação e correção de problemas de aderência pneu/pavimento, para maior segurança aos usuários. Já o micro a quente deve ser melhor explorado, inclusive em pavimentos urbanos. O problema geométrico urbano - com a impossibilidade de elevação de grades das ruas, pois causaria problemas de sobre elevação indesejada, de drenagem de águas de chuva e redução de altura abaixo de pontes, entre outros, demanda soluções delgadas de restauração como essa.

M&T: O 5MA (matriz pétrea asfáltica) é a solução ideal para tráfego pesado?
Liedi: É sem dúvida uma nova solução que vem para ficar. A primeira experiência brasileira com esse produto, que ocorreu em 2000, no Autódromo de interlagos (SP), foi e tem sido um verdadeiro sucesso. Recentemente, outros dois trechos de SMA foram construídos: um deles na Via Anchieta, sob fortíssima solicitação de tráfego de caminhões pesados que descem para o Porto de Santos, em uma curva extremamente fechada. Tudo indica que seu comportamento tem sido muito bom, apesar de já decorridos cerca de 10 meses. Outro, também sob condição severa de tráfego é um trecho experimental construído no Corredor Tecnológico.

M&T: Qual é a composição asfáltica mais indicada para vias de tráfego intenso?
Liedi: Temos várias soluções atualmente, mas sua escolha depende da estrutura pré-existente ou do local dos novos projetos. Deve-se utilizar o princípio de misturas asfálticas que suportem bem a fadiga (trinquem muito mais tarde) como camada inferior asfáltica e de misturas asfálticas que suportem bem as deformações permanentes, como camada superior, que sofre altas tensões de compressão, como forma de evitar ondulações, escorregamentos e corrugações. Dependendo do tipo de tráfego e velocidade, o ideal é finalizar com uma camada delgada ou ultra delgada para dar conforto aos usuários e segurança em dias de chuva com a redução de spray, de reflexão de luz, de acqua planagem, etc.

M&T: Essa evolução dos produtos tem sido acompanhada pelos equipamentos de pavimentação asfáltica?
Liedi: Sim. Estão disponíveis no mercado equipamentos de altíssima performance, assegurando grande qualidade de execução.

M&T: A "culpa" de uma pavimentação inadequada é do asfalto, do equipamento, da equipe de execução do serviço ou dos três?
Liedi: Acaba sendo de uma conjugação infeliz, abrangendo vários motivos e, no fim, culpam os asfaltos, que estão dentro das especificações brasileiras. O problema não é esse, mas sim aplicar o produto errado em vias que não comportariam essa solução. Portanto, o problema é a solução escolhida ou a falta de conhecimento de que estão disponíveis vários tipos de asfalto, convencionais e modificados. Além disso, a dosagem das misturas asfálticas - ou seja, quanto entra de agregados, de filler, de areia e de asfalto - pode estar mal elaborada, tanto em termos de componentes quanto de suas proporções. Por outro lado, os equipamentos, às vezes, nao têm o desempenho esperado para aquele tipo de obra (usina de asfalto mal regulada e equipamentos impróprios para essa execução). Também a técnica construtiva pode ser inadequada, com a mistura aplicada em temperatura errada, compactação ineficiente, etc. Por fim, não podemos esquecer da responsabilidade dos órgãos no controle e recebimento técnico das obras embora alguns, como a Dersa (Desenvolvimento Rodoviário S.A) e as concessionárias sejam mais rígidos e nao aceitem serviços mal executados. Some-se a isso tudo a falta de cultura brasileira de conservação e manutenção preventiva, onde não há intervenções prontas ao primeiro sinal de problema. Um pavimento com grande incidência de buracos é um atestado da falta de manutenção e da organização, da gestão, desse sistema.

M&T: Então, o que falta para uma manutenção preventiva adequada desses pavimentos?
Liedi: Falta conscientização, o que abrange cultura de manutenção e o conhecimento das diversas técnicas disponíveis. A velha conversa de utilizar a solução feijão-com-arroz, como muitos apreciam, precisa acabar. Esta é uma questão de tecnologia e não de culinária.

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