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Apesar da evolução trazida pelo novo Marco Legal, o setor de saneamento ainda requer investimentos expressivos para que o país supere definitivamente esse grave problema estrutural e de saúde pública, alcançando a meta para a universalização dos serviços, estabelecida até 2033.
De acordo com Christianne Dias, diretora-executiva da Abcon Sindcon (Associação e Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto), o saneamento vem avançando desde então, graças aos incentivos à concorrência e à consolidação de diretrizes que fortalecem a segurança jurídica para as empresas investirem.
“Com a realização do leilão do Pará, agora em abril, os investimentos contratados desde o Marco Legal via concorrências públicas já somam R$
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Apesar da evolução trazida pelo novo Marco Legal, o setor de saneamento ainda requer investimentos expressivos para que o país supere definitivamente esse grave problema estrutural e de saúde pública, alcançando a meta para a universalização dos serviços, estabelecida até 2033.
De acordo com Christianne Dias, diretora-executiva da Abcon Sindcon (Associação e Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto), o saneamento vem avançando desde então, graças aos incentivos à concorrência e à consolidação de diretrizes que fortalecem a segurança jurídica para as empresas investirem.
“Com a realização do leilão do Pará, agora em abril, os investimentos contratados desde o Marco Legal via concorrências públicas já somam R$ 176 bilhões”, argumenta.
Todavia, como a demanda de investimentos previstos para a universalização dos serviços pode chegar a cerca de R$ 900 bilhões – conforme estimativa da KPMG em estudo realizado para a própria Abcon Sindcon –, é preciso acelerar ainda mais os aportes nos próximos anos.
“Para este ano e o próximo, já temos confirmados alguns leilões importantes, como os de Pernambuco e Goiás, o que é um bom sinal”, diz ela.
Christianne Dias, da Abcon: investimentos contratados
já somam R$ 176 bilhões. Foto: ABCON SINDCON
EQUILÍBRIO
Esse avanço é urgente, pois a realidade é incômoda. Atualmente, 32 milhões de brasileiros ainda não têm acesso à água potável, enquanto 93 milhões de pessoas convivem com a falta de coleta e tratamento de esgoto e 4,4 milhões não possuem sequer acesso a banheiro em suas residências.
“Diariamente, lançamos 5.200 piscinas olímpicas de esgoto bruto na natureza, que vai parar em nossos rios e mares, gerando uma série de doenças”, afirma a presidente-executiva do Instituto Trata Brasil (ITB), Luana Pretto.
“No ano passado, foram registradas 344 mil internações por doenças associadas à falta do saneamento básico, como diarreia, hepatite e dengue, que poderiam ser evitadas com acesso pleno ao saneamento básico.”
De acordo com o ITB, a região Norte do país é a mais desafiadora em termos de saneamento, pois apenas 64% da população tem acesso à água tratada e apenas 14% contam com coleta e tratamento do esgoto.
Especificamente em relação ao esgoto, o Nordeste também representa um desafio considerável para o segmento, pois apenas 30% do volume gerado nessa região é devidamente coletado e tratado.
“Se o objetivo é construir um país mais igualitário, com condições justas de desenvolvimento para todos, a infraestrutura de saneamento básico é a base para a busca desse equilíbrio social”, considera a executiva.
Segundo os especialistas, o fator fundamental para a ampliação das obras, que permitirão alcançar as metas estabelecidas no Marco Legal, continua sendo a conscientização da sociedade quanto aos ganhos sociais, estruturais e econômicos que isso representa para o país.
Segundo estudo do ITB, o acesso universal ao saneamento básico viabilizaria a incorporação de R$ 1,4 trilhão em benefícios socioeconômicos à população.
“Após a universalização dos serviços, a economia total obtida com a melhoria das condições de saúde da população pode chegar a R$ 25 bilhões até 2040”, dimensiona Rafael Cares, gerente de aplicação e produtos da Pensalab, empresa com foco em instrumentação analítica.
Luana Pretto, do ITB: saneamento é a base
de um país mais igualitário. Foto: ITB
PILARES
Mesmo ainda incipiente para atender a todo o território de forma mais igualitária, o Marco Legal fez com que o país passasse a abordar a questão com maior prioridade. Mas ainda é preciso perseguir as metas da legislação, que estabelecem cobertura correspondente a 99% de atendimento em água e 90% em esgotamento sanitário até 2033.
“Para isso, o Marco Regulatório estabeleceu três pilares básicos de atuação, incluindo a ampliação da concorrência com estímulo à participação da iniciativa privada, a segurança jurídica com maior uniformização da regulação e a regionalização como instrumento para garantir ganhos de escala e cobertura em todos os municípios”, detalha Cares.
Rafael Cares, da Pensalab: universalização trará
benefícios socioeconômicos. Foto: PENSALAB
Em relação ao primeiro ponto, aparentemente a lei tem surtido efeito. Desde a aprovação da Lei nº 14.026/2020, já foram realizados 58 leilões envolvendo 1.486 municípios, com R$ 176,3 bilhões em investimentos contratados e R$ 56,9 bilhões em outorga, que pode ser revertida para o saneamento rural, por exemplo.
Para os especialistas, esses leilões representam avanços concretos na estruturação de projetos, com reflexos diretos na realização de obras de água e esgoto em todo o país.
“O Marco trouxe maior segurança jurídica, metas claras de universalização e incentivos à regionalização dos serviços, ampliando a escala dos investimentos”, avalia Christianne Dias, da Abcon, citando os demais pilares.
“Além disso, a regulação passou a ter papel central na fiscalização do cumprimento das metas e da qualidade dos serviços.”
De acordo com Glaucia da Silva Souza, advogada do escritório Ciari Advogados, o Marco Legal de fato estimulou a entrada da iniciativa privada no setor, com metas mais claras de universalização e melhoria dos serviços previstas nos contratos de concessão.
“Desde a promulgação, o setor bateu recorde de investimentos, sendo que a operação privada no saneamento cresceu de 5% para 30% do total”, ela observa.
Da mesma maneira, o Marco introduziu arranjos político-administrativos considerados inovadores, como a regionalização dos serviços, na qual os municípios se agrupam para melhorar a eficiência e atrair investimentos, assim como a participação da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) na edição de normas de referência, assegurando maior uniformidade regulatória ao setor.
A diretora-executiva da Abcon Sindcon destaca ainda a introdução de dispositivos para tornar o licenciamento ambiental mais eficiente, “prevendo que a autoridade competente assegure prioridade e estabeleça procedimentos simplificados para o setor”.
Porém, para que as metas sejam atingidas até 2033, é essencial consolidar a regionalização com apoio da União, além de fortalecer as agências reguladoras, integrar planejamento e financiamento, aprimorar licitações e promover governança colaborativa.
“Também precisamos engajar o setor privado em modelagens contratuais econômica e financeiramente mais sustentáveis, garantindo eficácia na universalização dos serviços”, completa Glaucia, da Ciari Advogados.
Glaucia da Silva Souza, da Ciari Advogados: necessidade de
modelagens contratuais mais sustentáveis. Foto: CIARI
OBRAS PARADAS
Apesar dos avanços, ainda há desafios regulatórios e ambientais que precisam ser enfrentados para que o ritmo das obras acompanhe a urgência das metas. “É preciso prosseguir com as diretrizes da lei, fazer valer as exigências que fortalecem o setor”, apregoa Christianne Dias, da Abcon.
Como exemplo dessa necessidade, é possível citar o “Painel de Obras” do Tribunal de Contas da União (TCU), que acompanha empreendimentos com recursos do Orçamento Geral da União (OGU).
Em recente atualização, a sondagem registrou 404 obras de saneamento paralisadas, ou 16% de um total de 2.484 obras, representando 38% dos recursos investidos no setor.
Trata-se de um cenário preocupante, mesmo que o estudo do TCU situe-se fora da esfera de atuação dos operadores privados de serviços de água e esgoto. “A existência de um número significativo de obras interrompidas evidencia desafios estruturais que impactam o avanço do setor como um todo”, reconhece Christianne.
As obras de saneamento são empreendimentos grandes e complexos, explica Cares, da Pensalab, que podem ser afetados por uma variedade de fatores, desde o ponto de vista técnico, uma vez que podem surgir imprevistos durante a execução das obras, como dificuldades no solo, mudanças no projeto e outros fatores, até as mudanças no cenário político nas esferas municipal, estadual e federal.
“A troca de poder decisório pode levar à paralisação ou revisão de obras em andamento”, comenta o gerente. “Além disso, como muitas obras de saneamento dependem de investimentos públicos, a escassez de recursos também pode comprometer a execução.”
Todavia, na visão de Fernando Gallacci, sócio do escritório SouzaOkawa, o cerne das paralisações está na falta de planejamento para alocação dos investimentos.
“Evidentemente, esse panorama não é positivo para o setor, merecendo atenção imediata das autoridades, inclusive para acelerar e ampliar as políticas de repasse de ações materiais para coordenação de investidores privados”, complementa.
Sob a ótica do setor privado, é possível citar fatores como a morosidade na emissão e renovação de licenças, a ausência de critérios para inexigibilidade de outorga de lançamento de efluentes em rios degradados e a aplicação de padrões de qualidade mais restritivos do que os previstos pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), que comprometem a expansão dos serviços.
Além disso, os sistemas de distribuição e as estações de tratamento têm sido classificados como de alto impacto ambiental ou submetidos a enquadramentos desatualizados dos corpos hídricos, por exemplo, o que aumenta os custos e dificulta a adoção de soluções mais eficazes.
“Procedimentos mais ágeis, previsibilidade técnica e segurança jurídica são fundamentais para destravar os investimentos e acelerar a universalização do saneamento no país”, reforça Christianne, da Abcon Sindcon.
PRIVADO
Por falar em investimentos, atualmente a atuação privada está presente em 1.748 municípios do país (31,4%). Além disso, há 24 projetos em estruturação, com investimentos estimados de R$ 50,6 bilhões, como forma de garantir a universalização dos serviços de água e esgoto em mais 724 municípios.
Ainda em 2025, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) prevê a realização de 27 leilões, com atração de cerca de R$ 69 bilhões em novos investimentos, em 13 diferentes estados do país.
Para Gallacci, do escritório SouzaOkawa, deve-se deixar as obras públicas para empreendimentos contratados por meio de instrumentos tradicionais de licitação pública. “Já os demais investimentos devem ser repassados para investidores privados mediante concessões, PPP e privatizações”, argumenta o especialista.
Fernando Gallacci, da SouzaOkawa: falta de planejamento
freia alocação de investimentos. Foto: SOUZAOKAWA
Há ainda um fator técnico de alto impacto, pois é preciso contar com bons projetos de concessão. “Nesse quesito de modelagem, o BNDES tem desempenhado um bom papel, colaborando com os governos estaduais que desejam garantir o direito básico do saneamento para toda a população”, complementa Christianne Dias, da Abcon Sindcon.
MARCO LEGAL
Projeto quer ampliar o prazo de universalização para 2040
Em tramitação na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei no 4888/24 visa prorrogar a universalização do saneamento básico no país de 2033 para 2040. Segundo o PL, a proposta permite que o prazo seja prorrogado por até cinco anos, especialmente no caso de dificuldades técnicas, financeiras ou logísticas.
Autor do projeto, o deputado Amom Mandel (Cidadania-AM) projeta dificuldades para o país atingir a meta de 2033, principalmente por conta do “alto custo das infraestruturas e da necessidade de superar obstáculos geográficos, sociais e econômicos”, fazendo com que o prazo atual deixe de ser realista para algumas regiões do país, como a Norte.
A princípio, o projeto será analisado pelas comissões de Desenvolvimento Urbano (CDU) e de Constituição e Justiça e Cidadania (CCJC). Para virar lei, a proposta precisa ser aprovada pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal.
Proposta de prorrogação do prazo considera o alto custo das infraestruturas. Foto: FREEPIK
Saiba mais:
Abcon Sindcon: abconsaindcon.com.br
Ciari Advogados: ciarimoreira.com.br
Instituto Trata Brasil: tratabrasil.org.br
Pensalab: www.pensalab.com.br
SouzaOkawa: souzaokawa.com.br
Av. Francisco Matarazzo, 404 Cj. 701/703 Água Branca - CEP 05001-000 São Paulo/SP
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