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Revista M&T - Ed.183 - Setembro 2014
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A Era das Máquinas

O desafio dos guindastes sem motor

Por Norwil Veloso

Elevar cargas de porte considerável a grandes alturas sem dispor de tecnologias sofisticadas foi um dos maiores desafios no desenvolvimento histórico das civilizações. Na Antiguidade, já se moviam cargas muito pesadas ou a grandes alturas utilizando dispositivos que – mesmo rudimentares – implicavam em grande criatividade e engenharia. As colunas do templo de Karnak, por exemplo, tinham 23 metros de altura e vigas-travessa de 60 a 70 toneladas sobre elas. Já o maior obelisco do Egito pesava mais de 500 toneladas e tinha 30 metros de altura, enquanto as paredes do templo romano em Baalbek comportavam monólitos de 300 a 750 toneladas. Mesmo nos dias atuais, seriam necessários guindastes impressionantes para a movimentação dessas cargas.

E isso continuaria na Idade Média, nas construções das catedrais góticas. Embora não empregassem cargas tão pesadas, tais obras exigiam içamentos a alturas até 160 metros, ou seja, ainda fora do alcance mesmo da maioria dos guindastes modernos.

Como o homem conseguiu fazer isso sem tecnologia?, talvez se indague o leitor.


Elevar cargas de porte considerável a grandes alturas sem dispor de tecnologias sofisticadas foi um dos maiores desafios no desenvolvimento histórico das civilizações. Na Antiguidade, já se moviam cargas muito pesadas ou a grandes alturas utilizando dispositivos que – mesmo rudimentares – implicavam em grande criatividade e engenharia. As colunas do templo de Karnak, por exemplo, tinham 23 metros de altura e vigas-travessa de 60 a 70 toneladas sobre elas. Já o maior obelisco do Egito pesava mais de 500 toneladas e tinha 30 metros de altura, enquanto as paredes do templo romano em Baalbek comportavam monólitos de 300 a 750 toneladas. Mesmo nos dias atuais, seriam necessários guindastes impressionantes para a movimentação dessas cargas.

E isso continuaria na Idade Média, nas construções das catedrais góticas. Embora não empregassem cargas tão pesadas, tais obras exigiam içamentos a alturas até 160 metros, ou seja, ainda fora do alcance mesmo da maioria dos guindastes modernos.

Como o homem conseguiu fazer isso sem tecnologia?, talvez se indague o leitor. A resposta é que, na verdade, já nessas épocas remotas havia tecnologia para executar esses serviços. A diferença é que a força de elevação era gerada por seres humanos, em vez dos atuais equipamentos motorizados à disposição.

DISPOSITIVOS

Há cerca de 5 mil anos, foram desenvolvidos os primeiros dispositivos de manuseio de cargas que multiplicavam a força exercida por um indivíduo ou grupo de pessoas, permitindo o manuseio de cargas em portos, mineração, construção e outras áreas. Tais métodos milenares prevaleceram até o final do século XIX, quando começou a ser usado o vapor. Nessa época, aliás, os dispositivos sem motor eram tão elaborados que um único homem conseguia içar um caminhão de 15 toneladas com rapidez, usando somente uma das mãos.

O princípio básico de funcionamento desses dispositivos era a multiplicação de força por meio de sistemas de redução. Evidentemente, a multiplicação da força significava um aumento da distância de percurso necessária para sua aplicação. Em outras palavras, se a força de saída fosse o dobro da de entrada, a distância percorrida para aplicação da força (entrada) seria o dobro da distância percorrida pela carga na saída.

Os primeiros dispositivos utilizados foram alavancas, rampas e planos inclinados, sobre os quais não nos deteremos aqui. Desse modo, podemos considerar que o nascimento dos guindastes ocorreu de fato com a invenção da polia, cujos registros mais antigos estão na Grécia, por volta de 600 a.C. Posteriormente, os romanos assimilariam e aperfeiçoariam significativamente as tecnologias helênicas para construção de seus próprios monumentos.

EVOLUÇÃO

Inicialmente, a vantagem das polias era apenas alterar o sentido de aplicação da força. Tecnicamente, empurrar uma carga para cima permite um esforço máximo de 150 N (com só uma mão), enquanto puxar um cabo da mesma maneira permite a aplicação de 250 N.

Aumentando a capacidade de multiplicação do esforço humano, as polias compostas começaram a surgir a partir do século IV a.C. Nesse período, apareceram os conjuntos de três polias (trispastos) e cinco polias (pentaspastos), que multiplicavam o esforço aplicado por três e por cinco, respectivamente. Por outro lado, elevar a carga a 3 metros de altura com um desses sistemas exigia que a pessoa (ou grupo de pessoas) se deslocasse 9 ou 15 metros.

Outra evolução importante foi causada pela entrada em cena dos guinchos e cabrestantes, inventados quase na mesma época que os sistemas de polias compostas. Ambos eram constituídos por um tambor, com eixo horizontal ou vertical, respectivamente, cujos flanges possuíam furos onde eram introduzidas as alavancas para girá-lo. A multiplicação de força equivalia à relação entre o raio do tambor ou eixo e o raio da alavanca. Assim, um eixo de 5 cm de diâmetro acionado por alavancas de 30 cm multiplicaria a força por 6.

A diferença entre ambos é somente a posição do eixo, horizontal nos guinchos e vertical nos cabrestantes, elementos que também reduziram a necessidade de deslocamento, pois era mais fácil enrolar 9 ou 15 m de cabo que puxá-los por essa distância.

Com o tempo, o acionamento também se tornou bem mais simples, uma vez que um esforço de 25 a 50 kgf num sistema de 5 polias e um tambor com a relação citada (6:1) permitia gerar um esforço de saída de 750 a 1.500 kgf, ou seja, 30 vezes maior. Os cabrestantes também permitiam a atuação de grupos de pessoas, cada uma empurrando uma alavanca, o que aumentava bastante a capacidade de elevação do conjunto.

RODA DE PASSO

Um avanço ainda maior foi conseguido com o advento da roda de passo, mencionada pela primeira vez por volta de 230 a.C. e que permaneceu como um dispositivo de grande importância até a metade do século XIX. Essas rodas, cujo diâmetro ficava entre 4 e 5 metros, permitiam uma multiplicação de força ainda superior devido à maior relação entre os diâmetros da roda e do eixo.

Além disso, o esforço muscular do braço foi substituído pela maior força gerada pela caminhada da mesma pessoa no interior da roda. Acoplada a um tambor com raio de 10 cm, uma roda com raio de 2 m teria uma relação de 20:1 entre as forças de entrada e saída. Usando uma dessas rodas acoplada a um sistema de cinco polias, uma pessoa que transmitisse uma força de 50 kgf poderia elevar uma carga de 5 toneladas, ou seja, 100 vezes mais.

Alguns guindastes (principalmente guindastes portuários da Idade Média e posteriores) tinham duas rodas de passo acopladas ao mesmo eixo, permitindo que o esforço de duas pessoas viabilizasse capacidades de elevação da ordem de 7 toneladas. Como as rodas podiam ser mais largas, também era possível colocar duas pessoas lado a lado no interior de cada roda, dobrando a força de entrada. Mesmo levando em conta as perdas por atrito, a capacidade desse sistema ainda seria de 12 toneladas. Evidentemente, se a velocidade da caminhada na roda fosse de 5 km/h, a velocidade de elevação seria 20 vezes menor, ou seja, cerca de 4 m/min.

COMBINAÇÃO

Contudo, os blocos de pedra dos edifícios romanos eram muito mais pesados, sendo que vários obeliscos – um deles com cerca de 500 toneladas – foram trazidos do Egito e reposicionados em diversas cidades. E os trabalhos de descarga e içamento foram feitos combinando diversos dispositivos específicos.

Um desses métodos envolvia a construção de uma torre gigantesca, na qual eram instalados sistemas de polias ligados a cabrestantes colocados no solo. Esse sistema permitia, inclusive, o uso de animais para acioná-los.

Com o declínio do Império Romano, o uso desses equipamentos na Europa praticamente desapareceu por mais de 800 anos, voltando a aparecer somente nos séculos XIII (na França) e XIV (na Inglaterra).

Durante a Idade Média, inclusive, foram desenvolvidos e fabricados guindastes portuários acionados por rodas de passo, que eram projetados principalmente para assegurar alta velocidade de elevação e descida, fundamental na carga e descarga dos navios.

Leia na próxima edição: Aplicações criativas através da história



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