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Revista M&T - Ed.192 - Julho 2015
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Comércio Exterior

As multas abusivas na importação de bens

Por falta de licenciamento, burocracia aduaneira pode aplicar multas de até 30% sobre o valor da mercadoria, o que constitui um procedimento questionável e arbitrário
Por Walter Thomaz Junior

Dizem que uma mentira repetida com veemência acaba virando verdade. Tal máxima aplica-se a alguns procedimentos da burocracia brasileira, pois determinados erros são tantas vezes repetidos que acabam virando fatos aceitos por todos.

É o caso da aplicação forçada de multa baseada no artigo 706 do Regulamento Aduaneiro, que trata da importação de mercadorias ao desamparo de Licença de Importação. Vale lembrar que, com o advento do Siscomex, as Licenças de Importação substituíram as Guias de Importação, que se tornaram tão anacrônicas quanto a aplicação da penalidade. Na verdade, trata-se de um entulho burocrático convenientemente esquecido na Legislação aduaneira, mas que gera desdobramentos absurdos.

Vamos aos fatos. Na conferência física de mercadorias importadas, caímos numa dessas situações kafkianas quando se verifica um erro de classificação fiscal, por exemplo. Assim, a mercadoria passa a ser considerada como desamparada de Licença de Importação, uma vez que o licenciamento trata de mercadoria que não corresponde à que foi efetivamente importada. Ato contínuo, a Aduana aplic


Dizem que uma mentira repetida com veemência acaba virando verdade. Tal máxima aplica-se a alguns procedimentos da burocracia brasileira, pois determinados erros são tantas vezes repetidos que acabam virando fatos aceitos por todos.

É o caso da aplicação forçada de multa baseada no artigo 706 do Regulamento Aduaneiro, que trata da importação de mercadorias ao desamparo de Licença de Importação. Vale lembrar que, com o advento do Siscomex, as Licenças de Importação substituíram as Guias de Importação, que se tornaram tão anacrônicas quanto a aplicação da penalidade. Na verdade, trata-se de um entulho burocrático convenientemente esquecido na Legislação aduaneira, mas que gera desdobramentos absurdos.

Vamos aos fatos. Na conferência física de mercadorias importadas, caímos numa dessas situações kafkianas quando se verifica um erro de classificação fiscal, por exemplo. Assim, a mercadoria passa a ser considerada como desamparada de Licença de Importação, uma vez que o licenciamento trata de mercadoria que não corresponde à que foi efetivamente importada. Ato contínuo, a Aduana aplica multa por falta da – por incrível que pareça – extinta Guia de Importação.

A situação é ainda pior quando a multa é aplicada nos casos em que o Siscomex gera licenciamento automático. Nesse caso, ao menos, a mercadoria não consta sem Licença de Importação e a simples alteração de classificação não anula o licenciamento existente. O erro poderia ser sanado por meio da licença substitutiva.

Mas, infelizmente, há auditores que interpretam a lei de outra forma e há importadores que aceitam pagar a multa. Tais extravagâncias da burocracia geram indignação quando percebemos o propósito desse licenciamento e os (falsos) motivos para a aplicação de multas tão elevadas.

ARBITRARIEDADE

A Licença de Importação surgiu do compromisso do Brasil com o Acordo Geral de Tarifas e Comércio da Organização Mundial do Comércio (OMC) de usar o sistema de licenciamento aprovado em janeiro de 1995. O licenciamento atende a levantamentos estatísticos e o sistema gera licenciamento automático para 80% das mercadorias importadas no Brasil.

Para fins estatísticos, a multa aplicada por falta de licenciamento é de 30% sobre o valor da mercadoria. Ou seja, o mesmo valor aplicado à época das Guias de Importação, que constituía uma barreira não-tarifária. Note-se que esse procedimento não conta com o apoio do Judiciário. O Supremo Tribunal Federal, inclusive, considera despropositadas as multas superiores a 20% do valor do bem. O Supremo também já deixou claro que a retenção de mercadorias importadas para pagamento de diferenças de impostos ou multas é uma medida coercitiva e descabida, pois a Aduana não tem o direito de reter o processo de desembaraço.

Mas, para evitar a retenção da mercadoria, o importador se rende às exigências. Se tais procedimentos da Aduana não têm o apoio da mais alta corte do país, o que leva os importadores a cederem às arbitrárias exigências?

A resposta é simples. Os importadores brasileiros estão desinformados no que tange à Legislação aduaneira e, por isso, aceitam passivamente a interpretação da Aduana. Enganam-se ao acreditar que há questões que se resolvem somente na esfera administrativa, enquanto outras incidem exclusivamente na esfera judicial. Assim, dividem as tarefas delegando ao despachante aduaneiro as questões de natureza administrativa e a advogados as questões de natureza judicial. Na verdade, o caminho mais eficaz está na união dessas duas figuras, para um trabalho integrado e direcionado.

Por um lado, o despachante pode não ter uma visão jurídica mais ampla e aceitar sem contestar as teses da Aduana, ao passo que o advogado pode desconhecer os ritos e procedimentos aduaneiros, o que o leva a erros na formulação da defesa e a desperdício de tempo.

SUSCETIBILIDADES

A fama de um Judiciário moroso também cria resistências por parte do importador em associar o trabalho do advogado ao do despachante. Porém, muitas medidas judiciais têm um prazo curto (abaixo de 24 horas) para sua obtenção, muito menos do que o importador levaria para obter o Auto de Infração e a autorização para desembaraçar a mercadoria na esfera administrativa.

Receoso, o importador evita confrontos com a Aduana para não criar suscetibilidades. No atual regime democrático, a liberdade de recorrer ao Judiciário é condição básica de exercício da cidadania, não sendo interpretada como ofensa ao auditor da Aduana. Em muitos casos, o auditor se vê obrigado a aplicar penalidades por dever de ofício e respeito às regras de isonomia.

A Aduana brasileira é bastante madura e entende que se trata de um recurso legítimo do importador buscar seus direitos no Judiciário. Na verdade, trata-se de um jogo no qual quem conhece as regras tem mais chances de êxito do que aqueles que, por mero desconhecimento, acabam por aceitar a interpretação do oponente.

*Walter Thomaz Junior é sócio da Portorium Consultoria e consultor das Comissões de Direito Aduaneiro, Portuário e Marítimo da OAB/SP.

 

 

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