Revista M&T - Ed.127 - Agosto 2009
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Demolição

Por que aproveitamos tão pouco os resíduos da construção?

Algumas demolidoras já adotam a reciclagem como um diferencial para suas operações, mas a maior parte dos resíduos de construção ainda segue para bota-foras e, o pior, para destinações irregulares, embora existam tecnologias economicamente viáveis para se
Por Melina Fogaça

Os números são impressionantes e revelam o nível de desperdício registrado nos canteiros de obras do Brasil. Segundo um levantamento do professor Arthur Pinto Chaves, titular do departamento de Engenharia de Minas e Petróleo da Escola Politécnica da USP (Universidade de São Paulo), o país gera 68,5 milhões t/ ano de resíduos de construção e demolição, dos quais apenas uma parcela insignificante é reaproveitada em novas obras. “Ao contrário dos países industrializados, que adotam a reciclagem em larga escala, nós desperdiçamos esse material e consumimos recursos naturais que poderiam ser economizados com seu reaproveitamento, como brita e areia”, diz ele.

O agravante é que grande parte do entulho produzido em pequenas reformas e construções imobiliárias, que respondem pela maior parcela desses resíduos, acaba sendo disposta de forma irregular em terrenos baldios e leitos de rios e lagoas, gerando impacto ambiental e degradação urbana. “Não se trata de um problema de legislação, mas da dificuldade que os municípios têm de fiscalizar a destinação dada aos materiais recolhidos em caçamba”, explica Artur Granato, diretor da Nortec.

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Os números são impressionantes e revelam o nível de desperdício registrado nos canteiros de obras do Brasil. Segundo um levantamento do professor Arthur Pinto Chaves, titular do departamento de Engenharia de Minas e Petróleo da Escola Politécnica da USP (Universidade de São Paulo), o país gera 68,5 milhões t/ ano de resíduos de construção e demolição, dos quais apenas uma parcela insignificante é reaproveitada em novas obras. “Ao contrário dos países industrializados, que adotam a reciclagem em larga escala, nós desperdiçamos esse material e consumimos recursos naturais que poderiam ser economizados com seu reaproveitamento, como brita e areia”, diz ele.

O agravante é que grande parte do entulho produzido em pequenas reformas e construções imobiliárias, que respondem pela maior parcela desses resíduos, acaba sendo disposta de forma irregular em terrenos baldios e leitos de rios e lagoas, gerando impacto ambiental e degradação urbana. “Não se trata de um problema de legislação, mas da dificuldade que os municípios têm de fiscalizar a destinação dada aos materiais recolhidos em caçamba”, explica Artur Granato, diretor da Nortec.

Diante de uma situação que facilita a destinação irregular desses resíduos, a indústria de reciclagem de entulho encontra dificuldades para prosperar. Algumas prefeituras investiram na instalação de usinas de reciclagem, além das unidades privadas existentes, totalizando pouco mais de uma dúzia de instalações em operação no país. Todas se caracterizam pela baixa capacidade instalada - geralmente abaixo de 100 t/h - e a maioria delas se concentra em municípios paulistas, além de unidades instaladas em Belo Horizonte (MG), Londrina (PR) e Macaé (RJ).

Ganhos de custo

Muitas dessas usinas operam apenas com o estágio primário de britagem, por meio de um britador de mandíbulas, produzindo somente bica corrida para uso em obras de pavimentação urbana. Algumas delas, entretanto, já adotam a etapa secundária de britagem, com a produção de brita e de materiais mais nobres, como blocos, tijolos e demais artefatos de concreto

O professor Chaves ressalta o potencial econômico dessa atividade. Afinal, a coleta de entulho em caçambas tem um custo médio de US$ 15/m3 e sua disposição legal representa mais um gasto de US$ 10 a US$ 30/m3. Em contrapartida, o investimento numa usina de reciclagem não ultrapassa a faixa de US$ 1 milhão e, devido ao seu baixo custo operacional, proporciona rápido retorno ao capital. “O custo de produção de blocos a partir de entulho é 30% inferior ao dos artefatos convencionais”, ele afirma.

Artur Granato, da Nortec, explica que grandes construtoras imobiliárias de São Paulo já contemplam o uso de materiais reciclados em seus empreendimentos. A iniciativa é acompanhada de um rigoroso controle tecnológico, uma vez que o entulho chega às usinas muito contaminado com pedaços de papel, madeira e outros materiais não aproveitáveis. Mesmo assim, pesquisas acadêmicas e testes de campo comprovam que uma reciclagem cuidadosa, com a separação prévia dos materiais e a adoção de processos adequados, possibilita a produção até mesmo de concreto estrutural.

Material heterogêneo

“A tendência do mercado é adotar valores diferenciados para a caçamba de entulho, de acordo com a qualidade desse resíduo, ou seja, pelo seu nível de contaminação”, explica Granato. Como exemplo, ele cita a prefeitura de Americana (SP), onde o rigor na fiscalização conseguiu reduzir os índices de destinação ilegal dada ao entulho. Nesses casos, a operação requer cuidados devido à heterogeneidade do material. “É preciso conscientizar os geradores de entulho quanto à importância de uma separação prévia no canteiro, evitando a contaminação com pedaços de papel, de madeira e outros resíduos não aproveitáveis”, completa o professor Chaves.

A questão da heterogeneidade não se resume apenas à presença desses materiais, o que pode ser solucionado com uma separação manual na entrada da usina de reciclagem. O maior problema é que o entulho pode conter resíduos de demolição de concreto misturados com porções de areia, de argamassa, pedaços de gesso, amianto e cerâmica. De acordo como os especialistas, a presença de materiais de diferentes densidades impede que a reciclagem resulte em produtos mais nobres, como concreto estrutural, por exemplo.

A saída, nesses casos, pode ser a adoção de britagem a úmido e de jigues, equipamentos usados para a separação de materiais por densidade, conforme propõe o professor Chaves. Mas essa solução acaba impondo elevados custos operacionais e ambientais às usinas, exigindo a instalação de sistemas de deslamagem, de tratamento de efluentes, ciclones e classificadores de espiral. Por esse motivo, as instalações existentes no país adotam um procedimento operacional mais simples: a reciclagem de materiais misturados gera apenas bica corrida e resíduos compostos somente por concreto encontram aplicação mais nobre, como a produção de brita, blocos de concreto e outros.

Modelos indicados

Quando o material reciclado se destina a uma aplicação de maior responsabilidade, os especialistas alertam para a necessidade de uma etapa de britagem secundária. Nesses casos, o equipamento mais indicado é o britador de impacto, cuja operação produz uma fratura intergranular dos materiais, resultando em melhor separação entre o concreto e a argamassa. Além disso, o equipamento produz brita de maior qualidade granulométrica - em formato arredondado e não lamelar - permitindo o seu uso na produção de concreto.

Mesmo assim, Toshihiko Ohashi, gerente de aplicação de britagem e peneiramento da área de mineração da Metso para a América do Sul, ressalta que a maioria das operações de reciclagem existentes no Brasil adota apenas o britador de mandíbulas. “Ele é mais econômico que os modelos de impacto para aplicação com materiais mais duros ou abrasivos”, explica o especialista. Como o equipamento é aberto, o usuário pode interromper o processo e acessar sua boca para remover materiais não aproveitáveis “engripados” na mandíbula, como barras de ferro e outros contaminantes. Nos britadores de impacto, cuja câmara de fragmentação é fechada, isto é inviável e a presença desse tipo de resíduo pode ocasionar danos ao rotor.

Segundo Toshihiko, a Metso produz uma ampla variedade de modelos para esse tipo de aplicação, desde os britadores fixos até os conjuntos móveis sobre esteiras. “Nesse último caso, contamos com mais de 400 unidades da linha Lokotrak já comercializadas no mundo, dos quais 60% se destinaram a empresas de demolição.” No Brasil, entretanto, ele explica que a aplicação de britadores móveis para a reciclagem de resíduos da construção ainda ensaia os primeiros passos. “As construtoras têm se interessado por essa solução mais para a produção de brita em obras rodoviárias”.

O especialista explica que a reciclagem de entulho demanda britadores com capacidade na faixa de 50 a 200 t/h, embora a empresa disponha de modelos ainda maiores, incluindo até mesmo os mobilizados em grandes mineradoras. Como exemplo, ele cita a experiência da fabricante no fornecimento de um modelo fixo de 30 t/h para a usina da prefeitura de Sorocaba. O detalhe nessa operação é que a instalação é operada por detentos do presídio existente no município, cujo trabalho resulta em redução no cumprimento da pena.

Versatilidade dos conjuntos móveis

José Brum, gerente de desenvolvimento  de negócios da divisão de Processamento de Materiais da Terex para a América Latina, confirma a baixa utilização dos conjuntos móveis de britagem na área de reciclagem. “Ultimamente, entretanto, observamos que muitos clientes têm se interessado por essa solução”, ele complementa. O executivo cita o fornecimento de três unidades para uma pedreira do Rio de Janeiro que também atua na produção de concreto e está ingressando no mercado de demolição. “O equipamento é muito versátil e, como permite rápidas mobilizações, pode ser deslocado para a pedreira do grupo quando não está em operação numa obra.”

Nessa área, a empresa propõe aos clientes o conjunto móvel XR400, com abertura de boca de 1.100 x 700 mm e 400 t/h de capacidade. Até o momento, ela forneceu unidades dotadas apenas de britador de mandíbulas, mas eles também podem ser equipados com britador de impacto para a melhor produção de finos, bem como sistemas de classificação. “O modelo com britador de mandíbulas encontra larga aplicação na produção de bica corrida para a preparação de bases em obras rodovíárias e até mesmo na reciclagem de escória.”

Bernard Isnard, diretor da construtora Craft Engenharia, do Rio de Janeiro, confirma a versatilidade dos britadores móveis. A diferença é que a empresa opera com um modelo da austríaca Hartl, fornecido pela Machbert. “Ao contrário das outras marcas, que adaptaram os equipamentos de britagem de rocha para operações de reciclagem, este foi desenvolvido especificamente para enfrentar as agruras de um processo de demolição.” Além de contar com separador magnético para a remoção das barras de ferro, ele explica que o equipamento apresenta um ângulo de ataque diferente, permitindo a fácil remoção desse material. “Com isso, eliminamos as situações em que a barra engasga na saída da boca.”

Experiências de sucesso

A Craft figura como uma das pioneiras na reciclagem de resíduos de demolição, atuando nessa área desde 1997. “Não se trata de uma operação lucrativa, mas sim de uma preocupação ambiental que acabou se transformando em diferencial para o nosso negócio”, afirma Isnard. Por conta dessa estratégia, a empresa já conquistou contratos de demolição junto a clientes que prezam as questões relacionadas ao impacto ambiental. Além do britador móvel, a Craft opera com duas usinas fixas - atualmente quase em desuso - com 12 rompedores hidráulicos, três tesouras e uma caçamba britadora.

A Nortec, que atua como distribuidora dos equipamentos da linha Sandvik, também opera na área de demolição e reciclagem. Segundo Artur Granato, diretor da empresa, a reaproveitamento dos resíduos se torna viável em grandes projetos de demolição, como foi o caso do presídio Carandiru, em São Paulo, cujo entulho foi processado e vendido no mercado. “No caso de uma fábrica de cimento demolida no interior de São Paulo, apenas a ferragem removida justificou economicamente a reciclagem do entulho.”

Outra empresa com experiência nessa área é a locadora MaxxRental, de Porto Alegre, que opera com uma concha trituradora da Simex, fornecida pela Copex. O equipamento trabalha coplado a minicarregadeiras e se destina a menores volumes de produção. “A tecnologia tem apresentado alto índice de aprovação pelos clientes e uma demanda crescente”, atesta Marcelo Benites, diretor da empresa. Segundo ele, a concha produz entre 2 e 8 m3/h de material reciclado, com granulometria de até 100 mm, de acordo com a abertura da boca de saída.

Caçambas britadoras

O uso dessa ferramenta, aliás, começa a se popularizar entre as empresas de demolição devido ao menor custo de investimento e a sua facilidade de mobilização. “Sua instalação no equipamento portador não consome mais de 30 minutos e, se o sistema for dotado de engate rápido, a troca de ferramenta não passa de 5 a 10 minutos”, diz Antonio Grisci, diretor da distribuidora Copex. Com isso, mesmo empresas que dispõem de um britador móvel podem deslocar uma escavadeira equipada com esse implemento para uma área mais remota, otimizando o processamento do material demolido.

Segundo Grisci, a empresa atua com duas tecnologias distintas nessa área, das linhas Simex e VTN. Os equipamentos da primeira, que o executivo prefere denominar de conchas trituradoras, operam por sistema de eixo dentado acionado pelo sistema hidráulico da máquina portadora, cujo giro resulta na trituração do material. As caçambas da VTN, por sua vez, funcionam pelo sistema de mandíbula e podem ser aplicadas em máquinas de maior porte, como escavadeiras de 30 t de peso operacional. Caso a operação demande um material com curva granulométrica mais apurada, com sua classificação, Grisci recomenda o uso de uma concha peneira que também opera acoplada a máquina portadora.

Para José Alberto Moreira, diretor da Machbert, as caçambas britadoras não concorrem com os conjuntos móveis de britagem já que trabalham como auxiliares destes equipamentos. Sua empresa atua na distribuição das caçambas da Montabert, que também operam por sistema de mandíbula, e dos britadores móveis da Hartl. “Mesmo que o resíduo não seja reaproveitado na mesma obra, o simples fato de britá-lo resulta numa economia de 30% no seu custo de transporte, pois a redução granulométrica permite melhor acomodação na caçamba do caminhão e isso se traduz em menos viagens para fora do canteiro”, ele conclui

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