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Revista M&T - Ed.282 - Abril - 2024
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ENTREVISTA — LUIZ GUSTAVO ROCHA

“O dealer tornou-se um consultor da operação do cliente”

“As grandes oportunidades de investimentos geralmente aparecem nos períodos de crise”, diz o executivo nesta entrevista exclusiva à Revista M&T
Por Marcelo Januário (Editor)

Atuando há 28 anos no Grupo Tracbel – fundado em 1967 por Luiz Gonzaga Magalhães e outros sócios em Minas Gerais – o executivo Luiz Gustavo Rocha iniciou a carreira como estagiário, passando posteriormente por todas as áreas da empresa, incluindo peças, almoxarifado, marketing, comunicação, TI e vendas, em um período de aprendizado e amadurecimento.

A partir de 2005, saiu dos bastidores e chegou ao front como diretor regional de distribuição da Volvo CE para o estado de São Paulo, posição na qual permaneceu por cerca de cinco anos.

Após retornar a Minas Gerais por questões familiares, em 2012 assumiu a posição de CEO da empresa, àquela altura ainda centrada na Linha Amarela, justamente no momento que esse mercado iniciava uma trajetória de queda que reduziria em quase 75% o volume de negócios em apenas dois anos.

A partir de 2016, acelerou o processo de modernização da empresa com a


Atuando há 28 anos no Grupo Tracbel – fundado em 1967 por Luiz Gonzaga Magalhães e outros sócios em Minas Gerais – o executivo Luiz Gustavo Rocha iniciou a carreira como estagiário, passando posteriormente por todas as áreas da empresa, incluindo peças, almoxarifado, marketing, comunicação, TI e vendas, em um período de aprendizado e amadurecimento.

A partir de 2005, saiu dos bastidores e chegou ao front como diretor regional de distribuição da Volvo CE para o estado de São Paulo, posição na qual permaneceu por cerca de cinco anos.

Após retornar a Minas Gerais por questões familiares, em 2012 assumiu a posição de CEO da empresa, àquela altura ainda centrada na Linha Amarela, justamente no momento que esse mercado iniciava uma trajetória de queda que reduziria em quase 75% o volume de negócios em apenas dois anos.

A partir de 2016, acelerou o processo de modernização da empresa com a aquisição de concessionárias de caminhões e ônibus da Volvo, momento em que também investiu em sua formação acadêmica ao graduar-se em administração de empresas com ênfase em comércio exterior, com seguidas especializações e MBAs em instituições como Ibmec, Fundação Dom Cabral, IBGC, INSEAD (França), Kellog e Harvard (EUA), chegando a estudar na China quando a Tracbel começou a trabalhar com a SDLG.

No início de 2024, deixou o cargo para assumir a presidência da holding e do conselho de administração do grupo, cujo faturamento durante sua gestão saltou de R$ 700 milhões em 2013 para R$ 4 bilhões no ano passado, a partir de 11 aquisições realizadas no período, que se somaram a seis transações anteriores, passando a atuar em construção, mineração, transporte, florestal, agronegócio e operações portuárias.

“As grandes oportunidades de investimentos geralmente aparecem nos períodos de crise”, diz ele nesta entrevista exclusiva à Revista M&T.

Acompanhe os principais trechos.

• Após dez anos atuando como CEO, quais são as metas nessa nova etapa?

Minha missão no conselho é dar continuidade ao crescimento de uma forma bem conservadora em termos financeiros, ou seja, sem dívidas. Todas as aquisições são feitas com capital próprio, mas vão ficando maiores e mais complexas, o que traz a necessidade de um foco maior na estratégia. Também vamos acelerar as questões de tecnologia, formação de pessoas e estrutura de governança, que atualmente são os grandes desafios que temos pela frente, no sentido de acompanhar as mudanças nessas áreas.

• Como é a atuação e a estrutura do conselho de administração da empresa?

Buscamos reforçar a estrutura para que a Tracbel seja reconhecida como uma empresa de excelente desempenho operacional, mas também de governança aprimorada. Atualmente, o conselho inclui dois membros representando os acionistas majoritários, um membro representando os minoritários (outras duas famílias são acionistas) e quatro membros independentes, que são executivos de mercado. Em geral, a regra é “noses in and fingers out”, como dizem os norte-americanos, isto é, sentir o cheiro do negócio, mas manter as mãos fora para não atrapalhar a operação.


Política austera de caixa permite passar por ciclos difíceis, diz Rocha

• Como foi possível multiplicar o faturamento em uma década marcada por tantos obstáculos?

Uma coisa importante é a política de caixa, pois sempre vamos passar por ciclos difíceis, mesmo que ninguém esperasse por uma pandemia. Mas acabou que a pandemia teve um efeito contrário para o setor, até em função da demanda global por alimentos e minérios. Claro que a crise sempre é difícil, pois exige ajustes e mudanças, mas a empresa nunca ficou em risco e as grandes oportunidades de investimentos geralmente aparecem nos períodos de crise. E o caixa é superimportante porque possibilitou que a empresa estivesse em uma condição econômico-financeira boa para realizar aquisições durante todo esse período. E o e-commerce também ajudou muito a ganhar maior eficiência nas vendas.

• É possível que, com o crescimento acelerado, a empresa venha a fazer IPO em algum momento?

Em 2016, o faturamento do grupo foi de cerca de R$ 400 milhões e, neste ano, deve ultrapassar R$ 5 bilhões. Até em função dessa consistência dos resultados nos últimos anos, somos muito sondados por fundos de investimentos e bancos. Porém, nunca vimos justificativa para fazer um movimento de IPO, que exige uma destinação imediata de recursos. Quando se traz esses recursos para dentro do caixa, acaba-se penalizado no dia seguinte, pois ninguém investe em uma empresa para manter o dinheiro no caixa dela. Então, não vemos nenhum movimento nesse sentido nos próximos anos.

• A propósito, como é a política de dividendos da empresa?

Temos uma política conservadora, pois em média distribuímos apenas 15% do resultado entre os acionistas. Então, 85% do lucro é reinvestido no próprio negócio, o que certamente é um dos principais motivos que fez com que o grupo tivesse esse crescimento desde 2005, quando começamos a fazer aquisições. Para trazer um fundo como sócio, por exemplo, teríamos de utilizar esses recursos, e não temos nenhum interesse nisso.

• Como CEO, sua gestão foi marcada por aquisições e expansão para outros setores. Isso vai continuar?

Após 17 transações, aprendemos que o mais difícil não é a aquisição em si, mais sim a integração das equipes que vem depois. E continuamos a avaliar oportunidades não só de aquisições, mas também de novas opções de produtos para o mercado brasileiro. Foi assim que trouxemos a Tigercat e, agora, a linha de equipamentos portuários Kalmar e as retroescavadeiras da Bull. No caso da marca indiana Bull, buscamos produtos para complementar o portfólio, pois nunca trabalhamos com produtos que concorram com os que já temos. Não chegamos ao limite, mas, pelo contrário, estamos apenas começando, pois esse mercado tem muito potencial de crescimento.


Para as distribuidoras, a forma de se manter relevante passa pelo cuidado dado ao cliente como um todo

• Como foi definida a escolha pela marca Bull para concorrer em um mercado tão disputado como o de retroescavadeiras?

Desde que a Volvo deixou de fabricar retroescavadeiras estávamos sem essa linha de produtos. Analisamos diferentes fabricantes antes de definir a escolha por um dos maiores fabricantes da Índia, com equipamentos de tecnologia simples, mas robustos, com baixo consumo e que atendem à faixa de potência mais buscada pelo mercado brasileiro. E da mesma forma que fizemos com a Tigercat e, agora, com a Kalmar, nosso objetivo com a Bull é ser grande no curtíssimo prazo, pois não estamos entrando nessa linha para ser um negócio de baixo volume. Se vai incomodar a concorrência é uma opção de cada um.

• Com tantas ações de expansão, qual é a estrutura atual da empresa?

Hoje, são 40 unidades que empregam cerca de 1.650 pessoas, trabalhando de Norte a Sul do Brasil. Brinco que temos filiais do “Paraná ao Macapá” e, agora, estamos abrindo uma nova em Santa Catarina, para atender especificamente à Klabin. A maior parte está relacionada ao pós-venda, incluindo mecânicos, consultores técnicos, vendas de peças e serviços e atendimento ao cliente. Em 80% das filiais temos centros de treinamento, dedicados não só às nossas equipes, mas também aos clientes.

• Como é feito esse trabalho com os clientes?

Os centros são focados na formação de clientes que preferem ter suas próprias oficinas, muitas vezes de grande porte e que contam com frotas multimarcas. Essas empresas preferem ter mecânicos próprios para fazer as manutenções. Quando são serviços muito especializados, nos procuram para dar um suporte mais técnico.

• De que maneira a empresa atua na qualificação desses técnicos?

Prezamos muito a formação profissional, tanto dos nossos técnicos quanto dos nossos clientes. Hoje, temos turmas de formação de mecatrônicos em todo o Brasil, formando cerca de 100 profissionais por ano. Não conseguimos aproveitar todos, pois parte acaba indo para os clientes ou a concorrência. Mas faz parte do jogo, pois é melhor treinar e perder do que não treinar e todos ficarem. Esse projeto também abrange o social, com a Associação Profissionalizar, que já tem mais de 25 anos e forma anualmente em torno de 30 jovens entre 16 e 18 anos como auxiliares de mecatrônica. Ao todo, já formamos mais de 800 cidadãos, que podem assim seguir a própria vida. Alguns ex-alunos, inclusive, hoje são mecânicos de aviões ou diretores de grandes empresas.

• Como avalia o momento do mercado brasileiro?

Você nunca tem tudo o que está muito bom, mas também nunca o que está muito ruim. Algumas regiões estão um pouco mais firmes e outras mais pessimistas. O Pará, por exemplo, está voando, com a mineração crescendo e a agricultura chegando ao sul do estado. E contar com um portfólio completo e atender a distintas regiões traz uma segurança muito maior.


Segundo o executivo, introdução de produtos complementares ao portfólio está apenas começando

• Acredita que chegou o momento de atuar no exterior?

Já fomos convidados várias vezes para atuar fora do país e, inclusive, estamos avaliando alguma coisa em outros países. Seria normal expandir para a América Latina, pois é mais próxima e com alguns mercados estáveis, mas a região hispânica também é tão complexa quanto o Brasil. Por enquanto, ainda há muita oportunidade no Brasil, com muito a ser feito aqui. Mas a gente continua estudando algumas dessas opções.

• Por que decidiram atuar com seminovos e usados?

Basicamente, a ideia é atender a necessidade do cliente que quer continuar crescendo e não tem como especialidade vender equipamento usado. Além disso, um grande gargalo das locadoras é fazer a desova dos usados, senão o negócio não fecha. Lembro ainda que, lá atrás, esse já foi um dos principais negócios da Tracbel, após a assistência técnica.

• A exemplo de outras empresas, a Tracbel avalia entrar na locação?

No passado, já tivemos uma operação de rental, mas o principal motivo de termos saído desse mercado é a concorrência que se cria com os nossos próprios clientes de locação. Pelo menos por enquanto, nosso negócio é vender máquinas para os nossos clientes, sejam locadores ou usuários finais, oferecendo suporte para que continuem rodando.

• Como a tecnologia está transformando as distribuidoras de máquinas?

Estamos adentrando em uma era de foco na operação do cliente, no sentido de aumentar a eficiência a partir dos dados da operação. Assim, o papel do dealer tende a se tornar muito mais o de um consultor da cadeia de produção do cliente do que simplesmente um fornecedor de equipamentos e assistência técnica. A forma de se manter relevante vai ser muito mais cuidando do cliente como um todo, organizando os dados e gerando valor a partir da tecnologia e da aplicação dos equipamentos. E as empresas que não fizerem isso vão ficar para trás, pois a tecnologia reduz cada vez mais a relevância dos intermediários. (MJ)

Saiba mais:
Grupo Tracbel:
www.tracbel.com.br

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