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Revista M&T - Ed.273 - Maio 2023
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MÃO DE OBRA

O gargalo da capacitação

Ensino de baixa qualidade, falta de investimentos e novas demandas sociais tornam ainda mais aguda a carência de profissionais na construção, que se movimenta para superar o problema
Por Marcelo Januário (Editor)

Há tempos, a escassez de mão de obra representa um dos principais gargalos dos setores produtivos no país, especialmente na construção. Por outro lado, o Brasil é hoje o 2º país com o maior número de jovens sem ocupação, segundo dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Do total, 36% dos jovens entre 18 e 24 anos não trabalham nem estudam – o que significa 12,3 milhões de pessoas em números absolutos. “Esse é um número astronômico, maior que a população da Bélgica”, espanta-se Rodrigo Almeida, diretor de recursos humanos do Grupo Tracbel.

Segundo ele, os jovens atualmente buscam empregos não convencionais – muitas vezes, preferem trabalhar em startups, fintechs ou outras iniciativas dessa natureza. Por isso, a preocupação com o tema é crescente, uma vez que 41% das empresas já não conseguem preencher posições que exigem competências técnicas – o que, na visão de Almeida, está relacionado ao ensino de baixa qualidade, que não acompanha as novas tecnologias.

“A questão é descobrir como as nossas empresas podem ser atrativas para os jovens”, reflete o executivo.

Na construção, prossegue Rocha, ainda falta um movimento organizado que torne o setor mais atrativo, como já acontece no agribusiness. “Em média, levamos 57 dias para contratar um técnico mecânico, justamente pela baixa disponibilidade de técnicos no mercado”, relata.

“Ao mesmo tempo, vemos o setor agrícola puxando muita gente do setor de máquinas pesadas e até de caminhões, incluindo operadores e mecânicos, pois está remunerando melhor que os outros setores.”

Para o CEO do Grupo Tracbel, Luis Gustavo Rocha, a origem do problema é mesmo a educação inadequada, aprofundada pela falta de investimentos e de oportunidades para as pessoas menos favorecidas. “Es


Há tempos, a escassez de mão de obra representa um dos principais gargalos dos setores produtivos no país, especialmente na construção. Por outro lado, o Brasil é hoje o 2º país com o maior número de jovens sem ocupação, segundo dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Do total, 36% dos jovens entre 18 e 24 anos não trabalham nem estudam – o que significa 12,3 milhões de pessoas em números absolutos. “Esse é um número astronômico, maior que a população da Bélgica”, espanta-se Rodrigo Almeida, diretor de recursos humanos do Grupo Tracbel.

Segundo ele, os jovens atualmente buscam empregos não convencionais – muitas vezes, preferem trabalhar em startups, fintechs ou outras iniciativas dessa natureza. Por isso, a preocupação com o tema é crescente, uma vez que 41% das empresas já não conseguem preencher posições que exigem competências técnicas – o que, na visão de Almeida, está relacionado ao ensino de baixa qualidade, que não acompanha as novas tecnologias.

“A questão é descobrir como as nossas empresas podem ser atrativas para os jovens”, reflete o executivo.

Na construção, prossegue Rocha, ainda falta um movimento organizado que torne o setor mais atrativo, como já acontece no agribusiness. “Em média, levamos 57 dias para contratar um técnico mecânico, justamente pela baixa disponibilidade de técnicos no mercado”, relata.

“Ao mesmo tempo, vemos o setor agrícola puxando muita gente do setor de máquinas pesadas e até de caminhões, incluindo operadores e mecânicos, pois está remunerando melhor que os outros setores.”

Para o CEO do Grupo Tracbel, Luis Gustavo Rocha, a origem do problema é mesmo a educação inadequada, aprofundada pela falta de investimentos e de oportunidades para as pessoas menos favorecidas. “Esse é um problema estrutural do país, que também afeta o setor de equipamentos pesados”, ressaltou.

PROFISSIONALIZAÇÃO

A situação, evidentemente, tem feito as empresas se mexerem. No caso da Tracbel, a saída foi investir em programas que ajudem as empresas na busca por eficiência, produtividade e rentabilidade, além de estimular a contratação de mulheres. “Sabemos da importância da mulher no mercado de trabalho e, como a empresa está em fase de transformação cultural e organizacional, estamos trabalhando fortemente esse tema”, observa Almeida.

Com mais 1.100 colaboradores, o grupo atua em áreas como agricultura, construção, manuseio, florestal, agregados, cana de açúcar, mineração, logística e equipamentos portuários e de transporte.

“Essa diversificação exige estrutura e consistência na qualificação”, afirma o executivo, destacando que o mercado profissional está mais focado em questões de ESG, mantendo-se atento a pilares como valorização de pessoas e meio ambiente, diversidade, inclusão, ética, segurança, meritocracia e inovação. “Isso se tornou algo comum, pois o colaborador também escolhe o lugar para trabalhar”, diz.


Ensino de baixa qualidade não acompanha as novas tecnologias agregadas ao setor

Na estruturação, o grupo desenvolve projetos de aprendizagem e de porta de entrada, incluindo aprendizes e estágios, mas também ações de formação como os projetos ‘Profissionalizar’ e de ‘Assistente Mecânico’. O primeiro já capacitou 630 alunos desde 1995, com breve interrupção entre 2020 e 2022, no lastro da pandemia.

O programa inicialmente oferecia 11 meses de aulas teóricas e práticas, a maior parte realizada na filial de Contagem (MG). “Trata-se de um projeto social com o objetivo de formação de profissionais para o mercado, pois não conseguimos absorver todos os formados”, reconhece Rocha. “Acredito que esse é um papel social da empresa – e não só do governo.”

Buscando revelar e reter talentos, o projeto proporciona ocupação para jovens de 17 a 19 anos em situação de vulnerabilidade social – com acompanhamento desde a seleção. “Buscamos a emancipação econômica do jovem e de sua família por meio da profissionalização, empreendedorismo e geração de renda”, completa Almeida.

ABSORÇÃO

O projeto foi tão bem-sucedido que a empresa o expandiu para as filiais de Marituba (PA), Bebedouro (SP) e Itaitinga (CE).

“Em 2022, repaginamos alguns pontos, buscando maior participação de jovens em mais cidades”, prossegue Almeida. “Também tínhamos de fazer benchmark e, ao mesmo tempo, ter um projeto mais on-line, pelo menos em algumas das etapas.”

Reiniciado em 2022, o programa passou a oferecer formação básica em mecânica com especialização em mecatrônica e elétrica para jovens de 16 a 21 anos em situação de vulnerabilidade e sem experiência profissional. Já a duração passou a ser de oito meses, com 150 vagas por turma e expectativa de formar até 1.000 profissionais por ano.


Programas de capacitação têm ajudado a superar os desafios na contratação de técnicos

Durante o curso, o jovem recebe conteúdos on-line relacionados a temas como cidadania e inteligência comportamental, além de matérias como matemática, português e inglês básico.

“Buscamos fazer com que essas pessoas tenham qualificação para posições iniciais na Tracbel e no mercado”, afirma, destacando ainda parcerias com Senai, Senac e Fundação Dom Cabral, que possuem programas específicos de suporte a esse tipo de projeto. “Queremos ter alta absorção, mas ao mesmo tempo precisamos de responsabilidade social.”

Depois dessa trilha básica, passa-se para o eixo técnico, com o recrutamento de 15% dos participantes. A fase avançada é híbrida, com formação teórica e prática nas oficinas. Os participantes passam então a integrar o banco de talentos da empresa, além de serem indicados para clientes e parceiros. “O foco é o atendimento das necessidades dentro do nosso negócio, no curto, médio e longo prazo”, explica Almeida.

Já o programa ‘Assistente Mecânico Tracbel’ atua com profissionais de 18 a 35 anos que já tenham experiência. Em seis meses de treinamento, o escopo inclui seleção, formação, avaliação e retenção de mão de obra para a área de serviços, essencialmente como assistentes mecânicos de oficina/campo.

“Isso tem ajudado a superar os enormes desafios na contratação de técnicos”, completa o diretor. “Também promove o desenvolvimento regional, gerando oportunidades de emprego e desenvolvimento.”

Nas primeiras turmas, realizadas no ano passado em São Luís (MA) e Marituba (PA), houve 70% de absorção. “Gostaríamos de ter mais, mas sabemos que esse é um número bacana para as primeiras turmas”, diz ele, acrescentando que a 2ª turma teve início em janeiro de 2023, com 15 participantes.

EMPODERAMENTO

O diretor de operações da Skava-Minas, Jordão Duarte, também aponta a educação como um fator primordial. “O país oferece pouca oportunidade e o pessoal mais jovem está desvinculado do nosso setor”, frisa. “É um desafio mudar esse cenário e atrair essa turma, gerando oportunidade para que se aprenda a profissão.”


Para especialistas, solução é aprimorar os espaços de treinamento fora dos canteiros

Na construção e mineração, especialmente, não é possível formar um profissional dentro do local de trabalho, avalia Duarte, o que exige ações mais dirigidas.

Com demanda em alta e pouco tempo para recrutamento, seleção e aprendizagem, a solução está em aprimorar os espaços de treinamento. “Precisamos revisar nosso modelo atual”, afirma. “Precisamos de ambientes externos onde esses jovens aprendam a operar, para que depois possam vir mais preparados para o ambiente de trabalho.”

Até porque ainda vai demorar para se ter uma operação totalmente autônoma, o que em tese eliminaria o problema da qualificação de operadores. “No futuro teremos uma disrupção – ou seja, atrair mão de obra que, em algum momento, vai ser substituída pela Inteligência Artificial, o que será conflitante, pois a pessoa estará se capacitando para uma profissão que se tornará obsoleta depois”, opina Duarte.

Enquanto isso não ocorre, prosseguem as dificuldades em polos de mineração, por exemplo. Os motivos são vários, diz a gerente de SGI da Skava-Minas, Janaína Duarte.

“Temos buscado pessoas em diversas partes do país, seja em minas na Bahia, no Pará ou em outras regiões”, afirma. “Para as empresas, é um desafio cada vez maior se tornarem mais atrativas para reter a mão de obra.”

Como saída, a gerente avalia que as mulheres também podem atuar em qualquer segmento, valorizando-se assim o empoderamento feminino. “Já temos motoristas, operadoras de equipamentos e manobristas, de modo que a questão da mulher no ambiente de trabalho está bem equalizada dentro da empresa, mas temos de buscar mais ferramentas de inclusão.”

OPORTUNIDADES

A New Holland Construction é outra empresa que vem se dedicando à tarefa de inclusão feminina no setor. Segundo a vice-presidente para a América do Sul, Paula Araújo, a fabricante adota diversas iniciativas de valorização das mulheres. “Dados do IBGE de 2021 mostram uma taxa de participação feminina no mercado de trabalho de apenas 51,5%, contra 73% entre os homens”, diz ela. “A taxa de desemprego é o dobro entre as mulheres. Sabemos que é uma questão estrutural, que impacta toda a sociedade.”

Na construção, apenas 10% da mão de obra do setor é feminina. E isso porque, entre 2007 e 2018, houve um aumento de 120% da presença das mulheres nos canteiros.

“É um percentual alto, superando preconceitos e toda dificuldade que existe, mas quando se fala em números absolutos, ainda está muito aquém daquilo que seria necessário para que se busque construir uma sociedade mais inclusiva”, argumenta Araújo.

No mercado de máquinas, a situação é ainda mais aguda, pois em um universo de 180 mil empresas que contratam operadores, apenas 2% são mulheres. Trata-se de um mercado que movimenta R$ 26 bilhões por ano no país e, ao mesmo tempo, sofre com falta de mão de obra especializada.

“A diversidade não é apenas importante [socialmente], mas é necessária [economicamente]. Para termos uma sociedade mais homogênea, justa e humana, mas também competitiva”, destaca Paula Araújo.


Empoderamento da mão de obra feminina é outra estratégia para dirimir o déficit de pessoal

Dessa constatação surgiu a ação ‘Juntas para construir’, que busca evidenciar a força feminina na construção.

“A ideia é focar em capacitação, valorização e oportunidade: não ficar só no discurso, mas dar ferramentas para as mulheres se sentirem capazes”, pontua a executiva. A ação começou no ano passado, inicialmente em parceria com a ONG gaúcha ‘Mulher em construção’, que já trabalhava com eletricistas e pedreiras.

Um grupo de dez mulheres se inscreveu para receber capacitação certificada em retroescavadeiras, algumas já inseridas no mercado. Com uma nova turma prevista para este ano, a empresa já está em busca de outras áreas para capacitação, além de operação.

“Começou conosco, mas não é um movimento só nosso, gostaríamos que mais gente se envolvesse”, reforça a VP. “Com uma necessidade tão latente em nosso segmento, precisamos dar essa oportunidade, dar a mão a um público vulnerável que evoluiu muito.”

Quando o projeto foi criado, uma das questões mais importantes era atrair participantes de classes mais baixas, oferecendo oportunidade para entrada no mercado. “A capacitação não é simplesmente aprender a operar uma máquina, mas precisa englobar tudo o que está no dia a dia, desde segurança, formatos da operação etc.”, delineia Fernanda Mesquita Cruz, analista de comunicação institucional da CNH Industrial.

Segundo ela, as mulheres têm receios se serão bem-aceitas e respeitadas em um ambiente ainda fortemente masculino. “Vemos muitas mulheres nas áreas administrativas e na liderança, mas quando vamos para o mercado da operação, 98% do mercado ainda é masculino, de modo que existe esse medo”, diz ela. “Por isso, a capacitação é muito importante, para que elas se tornem mais seguras.”


CENÁRIO
Escassez afeta ecossistema da construção

Um dos pontos de maior preocupação do setor de máquinas, a escassez de mão de obra foi debatida durante o 12ºWebinar da Sobratema, realizado em março.

“Com o mercado de máquinas de construção em franco crescimento, o segmento sofre com a escassez de mão de obra por diversos fatores, como o fato de os jovens preferirem os grandes centros, onde as oportunidades são maiores, mas também porque a qualificação em novos equipamentos exige maior capacitação”, ponderou Afonso Mamede, presidente da Sobratema.

O CEO do Grupo Tracbel, Luis Gustavo Rocha, concordou com a análise, destacando que a evolução tecnológica dos equipamentos acontece de forma muito rápida, gerando desafios não só para os operadores. “Corremos o risco de ter um apagão de mão de obra, inclusive na parte técnica”, advertiu.

Para ele, poderia haver um melhor alinhamento entre fabricantes, distribuidores e usuários de equipamentos, até para que não haja sobreposição e se ofereça uma formação melhor. “Os próprios locadores se interessam, pois o que vale para eles é ter o equipamento disponível e contar com um bom operador na máquina, o que impacta no valor residual do equipamento e é importante para se fechar a conta no final do contrato”, ressaltou o especialista.

Segurança – Segundo o instrutor do Instituto Opus, Carlos Gabos, o hiato de capacitação provocado pela pandemia fez com que se registrasse um aumento considerável do número de acidentes com equipamentos de içamento.

“Isso correu porque essas pessoas não estão capacitadas com o nível de segurança necessário para uma operação de movimentação de carga”, sublinhou. “Então, é importante que as empresas que vão qualificar esses profissionais tenham noção do que pode ser desenvolvido. É uma área que não admite meia capacitação.”


Em movimentação de carga, a falta decapacitação acarreta aumento de acidentes

A ABNT, disse ele, recém-finalizou uma norma de certificação de terceira parte, em que as empresas fazem a qualificação e uma unidade de terceira parte certifica se o profissional tem a capacitação necessária para operar com movimentação de carga.

“Algumas empresas só estão contratando pessoas com ensino médio ou técnico completo”, observou. “Por isso, a maior dificuldade é encontrar essas pessoas, ou seja, aquele jovem que precisa ser incluído, mas não tem o ensino básico completo.”

Confira a íntegra do evento.

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